Alessandra Faria
Comunicação do Sistema OCB/GO

De uma união de esforços surgiu a Cooperativa de Trabalho de Reciclagem Ambiental dos Catadores em Ação, a Cooper-Goianira. Localizado a 20 quilômetros de Goiânia, o município conhecido como ‘cidade das flores’ teve seu aterro sanitário recentemente desativado e precisava encontrar uma solução para o descarte do lixo produzido pela população local.

Com ações diretas da Prefeitura Municipal, das secretarias de Estado da Retomada e do Meio Ambiente e com apoio do cooperativismo, foi inaugurada a primeira cooperativa de reciclagem de Goianira, no dia 17 de agosto deste ano. 

Na prática, o trabalho dos 21 cooperados na coleta e reciclagem dos resíduos sólidos da cidade começou no último dia 4 de setembro. O presidente da Cooper-Goianira, João Batista da Silva Borges, conta que sem a ajuda da Prefeitura, do Estado e do Sistema OCB/GO não seria possível o começo do negócio. Em dois meses, eles já arrecadaram 54 fardos de materiais. “A gente tem muita dificuldade e carência, se não fossem eles para nos ensinar e também dar esse apoio com caminhão e máquinas, não ia dar para começar esse trabalho ainda não”, explica. 

Para a Prefeitura Municipal, criar a Cooper-Goianira atendeu o objetivo de fortalecer as cooperativas de catadores e pessoas em situação de vulnerabilidade, gerando emprego e renda, além de proteger o meio ambiente, com a inserção dos resíduos recicláveis na cadeia de produção.

“A prefeitura encerrou a atividade do lixão, dando início à coleta seletiva, por isso, destinou para os cooperados um galpão, uma mesa separadora e um caminhão, em parceria com Ministério Público (MP-GO) e a Câmara Municipal, além de destinar um salário mínimo e uma cesta básica para cada catador se manter até que a cooperativa seja autossustentável”, esclarece Igor de Oliveira Ribeiro, coordenador administrativo do Centro de Referência da Assistência Social De Goianira (CRAS). 

Galpão da Cooper-Goianira

SESCOOP/GO 

No caso da Cooper-Goianira, o trabalho da gestão pública em estimular o cooperativismo chamou a atenção das equipes do SESCOOP/GO e da OCB/GO que atuam em busca do desenvolvimento das coops de reciclagem. Por meio do programa Incubacoop e da ferramenta de diagnótico Aprimoracoop, os analistas em Desenvolvimento de Cooperativas e Gestão de Cooperativas atenderam os catadores, oferecendo suporte para que a coop tivesse o mínimo de condições de trabalho.

Com total apoio da entidade que representa as cooperativas em Goiás, os novos cooperados estão participando de um curso de capacitação. No mês passado, eles começaram o primeiro módulo de estudos do projeto Coopertrilhas, que visa mapear as etapas dos processos do negócio, com a identificação dos pontos de melhorias. 

Além das capacitações destinadas aos cooperados, o Sistema OCB/GO oferece diagnóstico de gestão, programas de monitoramento, instrução prática assistida e trilhas de conhecimento, tudo de forma gratuita.

O analista de Desenvolvimento da Gestão de Cooperativas do SESCOOP/GO Jefferson Rodrigues Paes conta que, durante visita à Cooper-Goianira para aplicação do diagnóstico Aprimoracoop, foram identificadas áreas de oportunidade que, quando otimizadas, podem gerar impactos significativos na eficiência operacional e na qualidade dos processos. “Também observamos que a Cooper-Goianira está sendo iniciada com um bom suporte e orientação de vários órgãos como a Prefeitura, as secretarias de Estado, o Ministério Público, além das cooperativas de crédito e do Sistema OCB/GO”, avalia. 

Em nossa área, temos o compromisso contínuo de acompanhar a cooperativa em suas dimensões operacionais, financeiras e econômicas. Nosso objetivo é contribuir ativamente para seu processo de evolução e gestão, não apenas para oferecer soluções pontuais, mas também capacitar a equipe da cooperativa para que possam, a longo prazo, tomar decisões assertivas e sustentáveis. Acreditamos que essa abordagem não apenas beneficia a coop, mas também reverbera positivamente em toda a comunidade, criando um ciclo virtuoso de desenvolvimento sustentável”, acrescenta Jefferson. 

Analista do SESCOOP/GO Jefferson Paes atendendo os cooperados da cooperativa de reciclagem.

Exemplos de união 

Com a iniciativa do CRAS de Goianira, a Prefeitura garantiu a entrega de cesta básica mensal para os cooperados, cedeu um galpão para as atividades e ainda disponibilizou um caminhão com motorista e combustível que está sendo custeado com recursos públicos municipais. A ideia dos gestores é firmar um contrato de no mínimo 10 anos para não ter influência política pelas futuras gestões.  

O Estado de Goiás contribuiu, por meio do programa Crédito Social, via Secretaria da Retomada, com uma prensa, uma balança, uma empilhadeira e um carrinho de transporte. Em uma parceria, que pode ser transformada no futuro por uma ação de intercooperação, o Sicoob CredSeguro se prontificou em doar móveis e equipamentos para a cooperativa.  

Se não bastasse o apoio físico, novos projetos estão sendo elaborados para aumentar a captação de resíduos sólidos na cidade. A vereadora Kátia Tourinho (PSDB) lidera a execução de um projeto de lei para a criação de um “Selo Verde”. A ideia é estimular o comércio local para a necessidade da captação de resíduos sólidos, trazendo como benefício um incentivo fiscal no IPTU.  

Prefeito de Goianira, Carlos Alberto Oliveira, com os cooperados da coop de reciclagem, na entrega dos primeiros benefícios.

 
Logística reversa   

Após meses de reuniões e audiências públicas, com participação de cooperativas de reciclagem, entidades gestoras e do setor empresarial, o governo de Goiás publicou o decreto 10.255, em abril deste ano, que regulamenta a política de logística reversa no Estado e cria o ReciclaGoiás. A grosso modo, ela obrigará as indústrias a custear o reaproveitamento de pelo menos 22% das embalagens recicláveis (vidro, plástico, metal e papelão) que colocam no mercado. A regra valerá também para importadores, distribuidores e comerciantes. Essa meta foi estabelecida pelo Acordo Setorial de Embalagens em Geral, mas o Plano Nacional de Resíduos Sólidos já prevê metas progressivas que aumentarão ao longo dos anos. 

Em Goianira, a expectativa da prefeitura é de expandir o trabalho da cooperativa para todos os bairros do município.  “Nossa intenção é que a gente possa no futuro coletar 100% dos recicláveis gerados na cidade”, esclarece o coordenador do CRAS. A motivação também tem objetivos financeiros, já que a Prefeitura paga por cada tonelada gerada de resíduos. “Quanto menos a gente gerar ou quanto menos a gente levar para a empresa responsável pelos resíduos, menos oneroso fica para o município no final do processo. É a resposta adequada que estamos dando à determinação e à orientação do Ministério Público”, afirma Igor. 

Cooperados reunidos no dia da inauguração da Cooper-Goianira

Reciclagem Coop

Atualmente, o Sistema OCB/GO possui 16 cooperativas de reciclagem registradas, com 259 cooperados ao todo. As coops desse ramos estão espalhadas em várias cidades de Goiás como Morrinhos, Santo Antônio de Goiás, Acreúna, Bela Vista de Goiás, Corumbá, Pontalina e Rio Verde. (Confira no quadro):

Cooperativas Cooperados 
COOP-RECICLA 34 
COOPRENGO 15 
COOPREC 26 
COOPER MORRINHOS 22 
A AMBIENTAL 16 
COOPERRECICLA 33 
COOPER SAG 11 
COOPER PONTALINA-GO 11 
COOPERBELA 
COOPERXIXA 16 
COOPERPB 12 
CORUMBÁ COOP 10 
COOPER-GOIANIRA 22 
COOPER ROSA 
COOPACREUNA 10 
COOPERATIVA DE TRABALHO E RECICLAGEM RAIO DE LUZ 
16 259 

História de cooperação 

Em 2019, o Sistema OCB/GO promoveu o 1º Seminário de Reciclagem. Durante o evento, alguns parceiros e entidades foram convidados a discutir sobre a atuação das cooperativas nas questões ambientais que envolviam a destinação correta dos Resíduos Sólidos Urbanos (RSU), a profissionalização na gestão e a capacitação dos catadores.  Nessa época, a unidade que representa as coops goianas já se destacava das demais unidades estaduais nessa área, pois trouxe à mesa de discussão um assunto relevante sob o ponto de vista ambiental, econômico e social.  A partir desse encontro, foi assinado um termo de acordo em que a OCB/GO isentava por dois anos a cobrança de contribuição para as cooperativas de reciclagem. 

A assinatura do termo de isenção da contribuição, além de um avanço, foi um incentivo para as cooperativas se formalizarem e se registrarem junto ao Sistema OCB/GO. Embora a norma geral do cooperativismo determine o registro das cooperativas junto a uma OCB estadual (art. 107 lei 5.764/71), muitas cooperativas ainda não possuem registro. Por ser um público historicamente explorado e cético com relação ao apoio que poderiam receber, o incentivo oferecido foi a porta de entrada para que essas cooperativas pudessem conhecer os programas da casa do cooperativismo em prol do desenvolvimento das cooperativas registradas. 

DNA cooperativista

Em termos de mercado, organização e gestão e até mesmo no apoio à estruturação dos espaços físicos das cooperativas, o cooperativismo tem incentivado a intercooperação, que é um dos princípios desse modelo de negócio. Com isso, as cooperativas de crédito estão sendo convidadas a apoiar o desenvolvimento das cooperativas de reciclagem para que elas se profissionalizem e se tornem competitivas. Dentro dessa perspectiva de parcerias e apoios, o Sistema OCB/GO, juntamente com a Secretaria de Estado da Retomada e o Sebrae/GO, incentiva a constituição de novas cooperativas, por meio do programa Incubacoop Goiás, programa voltado para novas cooperativas registradas na OCB/GO, que se destaca por todo o apoio desde a sensibilização, elaboração de plano de negócio, apoio documental e até a estruturação com a aquisição de maquinários.  

Mais do que incentivar a criação das cooperativas de reciclagem, as ações do Sistema OCB/GO contribuem para conscientizar os catadores sobre a necessidade de se organizarem em torno de um coletivo, mostrando que, na cooperativa, eles terão possibilidade de uma melhor renda, capacitação e qualidade de vida no trabalho”, pontua Emanuell Lopes, que é analista de Cooperativismo da OCB/GO.  

Além disso, o Sistema também tem atuado para que as cooperativas sejam fortes e perenes e que a rede de apoio, profissionalização, busca por novos parceiros, avanço de novos mercados e fortalecimento permita que os cooperados, ao serem retirados dos lixões e inseridos nessas referidas organizações, sejam reconhecidos e valorizados em seu trabalho e protagonistas no processo de gestão dos resíduos.   

Atualmente, uma parcela considerável de catadores sobrevive a partir dos lixões e, em Goiás, essa realidade não é diferente. Ainda que o trabalho seja precário e em quase sua totalidade exista um “dono do lixão” (atravessador que explora a mão de obra dos catadores, demarcando o território), é daquele ambiente insalubre, precário, perigoso e perverso que o catador retira o seu sustento e sua renda familiar.  

Com iminência de extinção dos lixões, determinada pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), muitos catadores estão apreensivos e com muitas dúvidas com a possibilidade de perderem sua única fonte de renda. A PNRS ainda prevê, entre outras ações, a criação de aterros controlados, a gestão compartilhada dos resíduos, a implantação de logística reversa e programas de coleta seletiva e o incentivo à criação de cooperativas de catadores de baixa renda, que poderão inclusive ser contratadas para prestação de serviço.  

Nesse sentido, as cooperativas formalizadas e registradas no Sistema OCB/GO poderão dar uma resposta que minimize tais dúvidas inerente ao futuro dos catadores. O catador, que geralmente tem pouca ou nenhuma escolaridade, terá a possibilidade de receber capacitação para gerir a cooperativa, uma vez que a cooperativa de trabalho é uma organização autogestionária, ou seja, os próprios cooperados, além de desenvolverem as atividades de catação, separação, triagem e prensagem, eles também deverão entender o mínimo de gestão”, explica Emanuell. 

Além de apoiar esse processo de gestão, no campo político, as unidades nacionais e o Sistema OCB nacional atuam fortemente para a implantação de políticas públicas que venham valorizar as cooperativas e os cooperados da reciclagem. A intenção é buscar, por meio de estudos e diálogo junto ao parlamento brasileiro, a desoneração dos tributos incidentes sobre a atividade de catação, de modo que as cooperativas sejam inseridas nos processos produtivos e tornem-se competitivas, mas sem perder o seu viés colaborativo.