Reportagem Coop
Com pouco mais de um ano de existência, a cooperativa Cooaspi está inovando ao investir no cultivo da baunilha do Cerrado, uma cultura ainda incipiente em Goiás, mas que apresenta grande potencial de mercado. Com o grama de baunilha custando entre R$ 10 e R$ 75, o valor mínimo de um quilo pode chegar a R$ 10 mil, tornando-se uma promissora fonte de renda para os produtores de Cocalzinho de Goiás.
“A produção de baunilha tem um altíssimo valor agregado. Em um pequeno espaço de agricultura familiar, é possível uma grande produção. A ideia é nos associar com outros grupos regionais e montar uma agroindústria. O valor do grama da baunilha chega a ser maior do que o da prata”, destaca Sirlei de Paula, cooperada da Cooaspi.
A cooperativa está sendo acompanhada pelo Sistema OCB/GO, dentro do Programa Negócioscoop, iniciativa da entidade nacional, a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB). Trata-se de um programa focado em modernizar, aprimorar e tornar as cooperativas ainda mais competitivas.
O Negócioscoop é iniciado com um diagnóstico participativo, a partir de demandas levantadas pelos próprios cooperados. Em seguida, é elaborado um plano de ação com diversas consultorias, para apoiar o negócio cooperativista. “A ideia é direcionar as soluções, fortalecer a organização social e as ferramentas de gestão, para que consigam aumentar receita e explorar novos mercados, até mesmo internacionais”, afirma o analista de cooperativismo do Sistema OCB/GO, responsável pelo setor de agricultura familiar, Rodolfo Barreto.
A produção de baunilha na Cooaspi é feita por 14 cooperados, com o apoio técnico do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar). Sirlei de Paula explica que todos os produtores e cooperados possuem acompanhamento técnico. “Nós contamos com a parceria da OCB/GO e com o SESCOOP/GO, que oferecem qualificação e capacitação. Já iniciamos o trabalho, fizemos o diagnóstico da cooperativa e estamos desenvolvendo as próximas etapas”, pontua Sirlei.
Na cooperativa, a baunilha é produzida em viveiros e agroflorestas. Além destes meios, o plantio da orquídea trepadeira também pode acontecer em florestas ou pomares. No Cerrado, a espécie de baunilha nativa é a Vanilla pompona, que se adapta bem às condições do bioma e é encontrada em diversas regiões.
Como a Cooaspi iniciou o cultivo
Uma das produtoras da Cooaspi, Maria do Carmo Maciel, relata que há um ano assistiu a uma palestra com o analista do Senar Saulo de Araújo. “Achei ótima oportunidade para aumentar a renda. Além da terra boa em Cocalzinho, estamos bem no centro de várias cidades”, conta Carminha, como é conhecida.
O cultivo da baunilha envolve um processo de crescimento e amadurecimento da planta, que leva aproximadamente quatro anos. No primeiro ano, as mudas são plantadas e começam a se estabelecer com suporte e condições adequadas de solo e sombreamento.
Nos dois anos seguintes, a planta cresce vigorosamente, desenvolvendo suas vinhas, mas ainda sem florescer. No quarto ano, a planta atinge a maturidade, começa a florescer e, após a polinização manual, produz as vagens de baunilha, que são colhidas e curadas para desenvolver seu aroma e sabor característicos.
“Quando ele [analista do Senar] mostrou a planta, o que eu achei mais interessante é que eu já tinha ela como orquídea aqui em casa. Eu ganhei a mudinha de um amigo e ela estava tomando conta da minha área”, relembra a produtora Carminha. Após a palestra, ela chegou em casa e já começou a fazer as mudas. “Eu não tinha ideia de como seria interessante essa baunilha. É uma oportunidade muito boa de renda e não é tão difícil cultivá-la”, completa a produtora.
Futuro promissor
Com o apoio do Sistema OCB/GO, a cooperada Sirlei aponta um futuro promissor para o cultivo em Cocalzinho de Goiás. “Com um técnico especializado em fruticultura e a preparação de novos profissionais, a capacidade de crescimento e produção de baunilha está aumentando significativamente. O primeiro grupo de baunilha foi iniciado há mais de um ano, com uma planta de cinco anos que já está produzindo frutos. As outras plantas ainda não têm frutos, mas começarão a florescer no início do próximo ano”, afirma.
Apesar do altíssimo valor agregado, poucos são os produtores de baunilha e o produto é escasso no mundo. De acordo com os produtores, isso acontece porque é um produto específico para a agricultura familiar, devido à necessidade de um manejo intensivo.
“A polinização das flores deve ser feita manualmente todos os dias, porque a polinização natural é inferior a 1%. Se a flor não for polinizada no dia certo, ela é perdida, tornando o trabalho diário essencial. Além disso, o processo de cura da baunilha é igualmente trabalhoso e manual, exigindo dedicação e precisão”, acrescenta Sirlei de Paula.
A Cooaspi planeja não somente vender da forma in natura, mas também atingir um mercado externo e se tornar um polo de referência, modelo no Estado de Goiás. A iniciativa busca alavancar o desenvolvimento regional e melhorar a qualidade de vida da população. Como muitos outros municípios do Entorno do DF, Cocalzinho é conhecida como ‘cidade-dormitório’ e tem como oportunidade principal os grandes mercados próximos, como nas cidades de Brasília, Goiânia e Anápolis.
“O que realmente vai fazer a diferença é o aculturamento, a união, transformar todo mundo em uma cultura e mostrar que nós somos fortes. Às vezes a pessoa tem dinheiro, mas não sabe como trabalhar e como alcançar todo mundo. Acredito no cooperativismo, acredito em Cocalzinho e acredito que unidos fazemos a diferença e deixamos de ser reféns de muitas situações”, conclui Sirlei de Paula.
Cultivo da baunilha no Brasil
A orquídea de baunilha é cultivada principalmente na ilha de Madagascar, onde a variedade Vanilla planifolia domina o mercado global. No Brasil, a baunilha é cultivada em regiões como a Mata Atlântica e o Cerrado, com a variedade Vanilla planifolia adaptando-se bem ao ambiente local, além de uma variedade endêmica do Cerrado, que apresenta qualidade comparável ou até superior à planifolia.
“A baunilha cultivada no Cerrado é pouco conhecida, mas possui um perfume diferenciado, natural e está ganhando reconhecimento na culinária brasileira. Ao contrário de muitas baunilhas disponíveis no mercado, que contêm compostos químicos derivados do petróleo, a baunilha do Cerrado oferece uma alternativa natural”, afirma Sirlei de Paula, da Cooaspi.
Chefs de cozinha no Brasil estão explorando a baunilha em diversas aplicações culinárias, como chocolates, refrigerantes, sorvetes, pratos salgados e sobremesas. Empresas como a Cacau Show estão desenvolvendo projetos para incorporar baunilha em seus produtos de chocolate. Além de seu uso na alimentação, a baunilha do Cerrado está sendo utilizada em produtos cosméticos e explorada por suas possíveis propriedades medicinais.
Originária da América Central, a orquídea de baunilha é explorada no Brasil desde a década de 1950 na Bahia, Pará, Espírito Santo e Goiás. Entretanto, é em Madagascar que se encontra o epicentro de um mercado estimado em 3 mil toneladas anuais, que abastece as indústrias de alimentação, cosméticos e fragrâncias no mundo.
Fonte: Ascom OCB/GO