Qual importância da intercooperação para o desenvolvimento e crescimento do cooperativismo?  

Um dos pilares de sustentabilidade de uma cooperativa, de qualquer segmento, é a intercooperação, independentemente de sua atividade. A busca por parcerias, convênios operacionais, estratégias mercadológicas ou outros serviços é fundamental para aquelas cooperativas que queiram crescer e serem mais competitivas no mercado nacional e até mesmo internacional, dependendo, é claro, do seu ramo de atividade. Os sete princípios universais do cooperativismo foram reordenados em 1995 pela Aliança Cooperativa Internacional, e a intercooperação, o sexto princípio, tem se mostrado, cada vez mais, como uma das principais ferramentas de sustentabilidade de mais de 3 milhões de cooperativas existentes atualmente no planeta. Na base, entre os cooperados, podemos afirmar que há e é extremamente necessária a intercooperação. Trocas de experiências e parcerias, por exemplo, os fazem ser mais fortes em suas atividades individuais. Horizontal e verticalmente falando, a intercooperação entre as cooperativas dos mesmos ramos e de diferentes atividades têm, de alguma forma, juntado forças com a finalidade de ganharem mais “corpo”, volume, representatividade e competitividade. Enfim, não consigo imaginar a sobrevivência de uma cooperativa sem este alicerce importantíssimo que é a intercooperação.  

De acordo com a sua experiência e percepção, há avanços das cooperativas no Brasil em relação a esse movimento de cooperação entre as coops?   

Todas as cooperativas que conheço na atualidade dos mais diversos segmentos, espalhadas em todos os estados da nação, têm de alguma forma buscado produtos ou serviços de outras cooperativas, sejam elas do mesmo ramo ou não, a fim de, entre outros motivos, diminuir custos operacionais, financeiros, administrativos, comercialização e industrialização. Muitas cooperativas que na década de 80 e 90 passaram por processos de dissolvência, causando vários problemas sociais e econômicos para seus cooperados, empregados, fornecedores e à comunidade como um todo, poderiam ter superado suas dificuldades (ao menos algumas delas) se houvesse à época uma maior consciência sobre a importância da intercooperação no processo de gestão de uma cooperativa. Nos tempos atuais, mesmo com tantas dificuldades para a sua plena aplicabilidade, a intercooperação tem se mostrado muito eficaz em vários aspectos. É uma necessidade tudo isso se a cooperativa almeja galgar melhores faturamentos, buscar novos produtos e serviços e, por que não dizer, melhorar ainda mais sua imagem perante a sociedade como um todo.  

Necessitamos deixar de lado as vaidades, orgulho, nossa individualidade e buscarmos “ter”, em conjunto com outra cooperativa, o que seria impossível sozinhos. Para isso, a receita é educação e conscientização cooperativista. Não há como ter intercooperação, se não houver a consciência e entendimento do cooperativismo.

O que é essencial para que as cooperativas entendam a importância desse princípio do cooperativismo?  

Eu diria que os gestores necessitam, constantemente, estar observando as necessidades de produtos e serviços de seu quadro associativo. Como está a satisfação do cooperado em relação aos serviços que a cooperativa presta a ele é algo a ser observado no dia a dia da sociedade. O maior objetivo de constituição de uma cooperativa, independentemente de segmento, é a “prestação de serviços ao cooperado”. Foi para isso que foi constituída e é para isso que ela tem que existir e sem a objetividade de lucratividade por trás disso. Se há algum lucro e não digo que não é necessário, é do cooperado. É ele o bem maior de uma cooperativa, é a razão de sua existência. Pois bem, para que a cooperativa tenha eficácia nesta prestação de serviços, não dependem apenas de sua estrutura operacional, de governança ou da movimentação do quadro associativo, mas, sim, de observar “para fora da porteira” novas oportunidades de negócios. Para que isso ocorra, é necessário se sentar com os pares, discutir, elaborar e contratar parcerias com outras cooperativas. Não podemos nos esquecer de enfatizar que a observância aos sete princípios: adesão livre e voluntária; gestão democrática; participação econômica; educação, formação e informação, intercooperação e preocupação com a comunidade necessitam ser praticados incansavelmente sem ao menos se distanciar de um, em detrimento ao outro. Não há intercooperação sem valorizarmos e praticarmos os demais. Não há sustentabilidade de qualquer cooperativa, por mais grandiosa que seja, se houver o afastamento dela de qualquer um dos princípios.    

Intercooperação é aconselhável para todas as cooperativas, grandes e pequenas?    

Estive recentemente, como palestrante, em um evento organizado pela OCB/GO, no 8º Fórum de Presidentes, e o tema foi a intercooperação. O que tive a honra de observar, além de poder estar ali conversando com representantes de dezenas de cooperativas e da OCB, foi a oportunidade de estarem sentados à mesa para os trabalhos de grupos de estudos destinados a eles, os gestores de cooperativas de vários segmentos. Praticamente todos os ramos do cooperativismo nacional, que hoje são sete, estavam ali representados por cooperativas pequenas, recentemente constituídas, e de médio e grande portes, que já têm toda uma expertise de anos de trabalho. Essas cooperativas puderam estar juntas neste evento, por intermédio de seus representantes, buscando novas parcerias e apoios. A intercooperação mostrou-se nesse dia e se mostra, a cada momento, muito necessária para qualquer tipo de cooperativa, independentemente seu ramo de atividade ou tamanho.   

Nessa perspectiva, há ainda muito para avançar nos Estados e no País?   

Eu tive o prazer de assistir a uma aula magna do professor Roberto Rodrigues, no curso de Gestão de Cooperativas do ISAE/FGV. E ele, sendo uma das pessoas mais comprometidas com o desenvolvimento do cooperativismo nacional e, porque não dizer, mundial, relatava em sua aula sobre a importância das cooperativas para o desenvolvimento do País. Segundo o professor, “precisamos levar educação cooperativista aos cooperados e empregados, e não perdermos o contato com o cooperado”. Assim ele relatava sobre a sua preocupação com as nossas cooperativas. Nesse contexto de educação cooperativista, tenho observado que não é apenas o aumento do faturamento, novos produtos e serviços, novas áreas de atuação e grandeza das cooperativas que as consolidam, e, sim, as estratégias por elas elaboradas, a fim de manter o quadro associativo sempre próximo, seja para a busca de um produto ou serviço, seja para um evento institucional ou uma Assembleia Geral. Esta participação só ocorre quando há confiabilidade de ambas as partes (em todos os aspectos) e, para tanto, necessitamos deixar de lado as vaidades, orgulho, nossa individualidade e buscarmos “ter”, em conjunto com outra cooperativa, o que seria impossível sozinhos. Há muito a ser feito ainda neste sentido e a receita é educação e conscientização cooperativista, na minha opinião. Não há como ter intercooperação se não houver esta consciência e entendimento do cooperativismo. Não há como levar aos cooperados algo que vá ao encontro de suas necessidades, sem que primeiro nos capacitemos para tal. Cooperação nos faz irmos mais longe, mas temos que compreender que essa não é uma tarefa fácil pois sempre há discordância, desentendimentos, incompreensões e não podemos deixar que isso nos impeça de continuar de alguma forma, com a união de forças.    

Que orientação daria para cooperativistas que ainda não viveram a experiência de desenvolver ações e acordos comerciais com outras cooperativas?  

Como eu já relatei, o fato de os gestores terem uma visão além de suas “porteiras” faz compreender que várias cooperativas são bem-sucedidas ou estão no mercado por conta da intercooperação. Mas o que, afinal, uma cooperativa pode ganhar com este princípio, seria:  
– Aumentar o tamanho, a escala, os ganhos, os benefícios aos cooperados;  
– É uma forma eficaz de superar as dificuldades individuais da cooperativa singular;  
– Razões internas:  redução de incertezas; melhorias no fluxo de caixa; compartilhamento de produção, serviços, trocas de expertises 
– Razões competitivas:  busca, expansão e espaço em novos mercados;  
– Razões estratégicas: obtenção de novas posições estratégicas e de negócios; diversificação; transferência de tecnologias (troca) e aprendizagem.
Porém, deve estar muito claro entre os gestores, empregados e quadro associativo em que lugar querem chegar, quais as estruturas necessárias para tal, qual o custo de tudo, se é realmente a necessidade dos cooperados. Se está muito claro tudo isso, a intercooperação poderá ser uma ferramenta imprescindível para alcançar os objetivos propostos.   

Quais os obstáculos enfrentados pelos gestores no processo de intercooperação?  

Sentar-se à mesa a fim de discutir um determinado projeto não é coisa simples para duas pessoas que têm opiniões divergentes. Não que isso não seja benéfico, afinal, nas divergências de ideias podemos encontrar caminhos novos e até então não observados por nós, se soubermos escutar. Vou relatar alguns desses dificultadores no processo de intercooperação que acho relevantes:  
– Vaidade dos dirigentes   
– Poder dos gestores acima dos interesses dos cooperados  
– Diferenças culturais  
– Falta de “consciência” cooperativista  
– Individualismo  
– Oportunismo  
– Disputas regionais  
– Baixa capacitação administrativa e de gestão dos executivos  
– Constante troca de diretoria das cooperativas envolvidas  
– Controle democrático limitado (não participação do cooperado no processo)  
– Processos de tomada de decisão e negociação entre as cooperativas sem consultar as bases.

Por que a participação do cooperado é relevante para o sucesso da intercooperação?  

Uma cooperativa só é sustentável se houver uma efetiva participação do quadro associativo em todas as suas atividades, seja para um negócio ou para uma participação institucional. Quando ocorre um processo de intercooperação entre cooperativas, o objetivo maior é atender melhor, com os produtos e serviços oferecidos ao seu maior patrimônio: o cooperado. Quando há entendimento sobre os “porquês” da intercooperação, o comprometimento é maior e os resultados podem ser melhores do que o esperado. Um dos valores do cooperativismo é a “transparência” e isso tem que ocorrer em todas as áreas, serviços e ações desenvolvidas pela cooperativa, sob pena de algo tão relevante, que é a intercooperação, não ter os resultados esperados ou nem ao menos ter um início. Certamente o cooperado necessita compreender que as suas necessidades individuais serão respeitadas, mas jamais poderão sobrepor-se sobre o interesse coletivo e esta regra também se aplica às cooperativas.